Por: Rodolpho Motta Lima
Ao final do ano, é natural que cada um de nós formule, ainda que
internamente, seus votos para o ano que entra. Nào deixa de ser uma
convenção porque, na realidade, essa esperança por coisas melhores é
algo que nos persegue a cada dia, a cada minuto. De qualquer forma, essa
passagem temporal acaba assumindo importância especial, talvez porque
seja um momento em que o congraçamento, a aproximação entre as pessoas,
parece fortalecer os desejos , conferindo-lhes um ar de concretizacão
possível, uma espécie de ”agora sim, vamos conseguir”.
Sempre me vêm à lembrança, nesta época, os versos do poema ”Cartão
de Natal”, de João Cabral de Melo Neto, nos quais o poeta pernambucano
constrói uma inusitada comparação entre os votos natalinos e as
esperanças juvenis dos estudantes que, ao início de cada ano letivo, se
comprometem internamente a “começar caderno novo”, uma metáfora para
uma atenção mais efetiva para com as atividades escolares. Quem passou
pelos bancos escolares sabe como é difícil manter esse desígnio,
diante do universo de atividades sedutoras que convidam a “deixar para
depois “ os compromissos com o estudo. Da mesma forma, o dia a dia do
novo ano, com suas obrigações, atribulaçõoes, surpresas e contratempos,
acaba por contribuir para que sejam sempre adiadas as boas intenções
originais.
Mas, felizmente, a persistência é uma das virtudes humanas
responsável por seu avanços e conquistas. E é por isso que eu também
faço agora meus votos, resumo de esperanças para 2013. Omito os de
âmbito estritamente pessoal, porque soariam como pouco originais e
muito egocêntricos: afinal, todos desejamos a própria felicidade e a
daqueles a quem queremos bem.
Anseio por um mundo sem guerras, algo que, embora talvez pareça
óbvio, a Humanidade até hoje não conseguiu alcançar – provavelmente por
estar ainda na sua pré-história em termos de evolução . Uma amoral
indústria bélica que sustenta ideias imperialistas, aliada a dogmas cujo
radicalismo chega ao fanatismo, tem impedido que sequer nos
aproximemos dessa realidade. A questão religiosa, que é o pano de fundo
(falso) para conflitos de motivação econômica, é também uma prova desse
nosso estágio civilizatório rudimentar. Se já é tão difícil acreditar
na existência de um Deus que comande esse descalabro, imagine-se essa
pulverização da divindade sustentada por fundamentalismos que dividem os
dois hemisférios do planeta. E já que é para sonhar com novos rumos, o
bom seria que a religião, se tiver que existir, refreie seu lado
perverso, fazendo predominar unicamente as mensagens de comunháo e amor
ao próximo, que, nas origens, inspiram todos os credos.
Ainda em termos planetários, a esperança vai para a extinção de todos
os regimes antidemocráticos, os escancarados por ditaduras e os
disfarçados de democracia, iinclusive falsas primaveras, que , em
realidade, têm servido de sustentação para a perpetuação de cruéis
desigualdades sociais.
Quanto aos valores que hoje comandam o mundo, os desejos se
encaminham para a redução da valorização do individual , do consumismo,
da mentalidade mercadológica que avalia as pessoas pelo que têm e não
pelo que são. Dirigem-se também para o fim dos preconceitos de qualquer
natureza – étnica, sexual, de gênero ou de status social - ,
inconcebíveis para uma espécie que se pretende civilizada. Quanto maior o
número de ações afirmativas que pretendam combater discriminações, mais
o homem se aproximará de um estágio que justifique o verdadeiro milagre
que lhe permite distinguir-se entre os seres com os quais convive.
Para o Brasil, especificamente, e dentro dessa perspectiva maior,
esperamos que o país prossiga em sua escalada no sentido da redução das
desigualdades, com projetos e programas sociais de grande alcance, a
despeito de todo o mau agouro dos abutres de sempre. Que o nosso país
continue a destacar-se no concerto das nações, mantido o respeito que
granjeou no cenário internacional. Que a educação e a saúde imponham-se
como metas prioritárias, apesar dos tubarões do ensino e dos vorazes
planos de saúde que proliferam por aí. Que o poder executivo se mantenha
na posição republicana e estadista que vem revelando, atuando nos
pontos críticos verdadeiros e reagindo a crises pré-fabricadas. Que a
composição do poder legislativo passe por uma reforma política capaz de
retirá-lo da indigesta posição que vem ocupando , de instituição
menos acreditada no país. Que o poder judiciário venha a comprovar sua
nunca antes tão propalada vocação pela construção da justiça, com
atitudes que desnudem outros escândalos nacionais – o mensalão do PSDB
mineiro, a Privataria Tucana, os Arrudas , Demóstenes, Cachoeiras e Dias
da vida, comprovando, assim, que não vem agindo casuisticamente,
contrariando a tradição jurídica em função de propósitos políticos.
Finalmente, que o nosso sistema midiático passe por mecanismos de
controle da sociedade, que não lhe permita a manipulação , a
parcialidade e a hipocrisia de alimentar-se de concessões e verbas
públicas para dinamitar os interesses do povo.
Embora utópicas como expectativas imediatas, são essas as nossas
esperanças, que dividimos com os leitores, lembrando, ainda com versos
de João Cabral de Melo Neto, mas em outro poema, que ”um galo sozinho
não tece uma manhã” e que, por isso, é na força das ações coletivas que
, no Brasil e no mundo , algumas dessas esperanças podem se
transformar em algo real.