Os fatos que estão movimentando o
cenário político do país só contribuem para robustecer a convicção de
que a rua é do povo, livre para manifestar suas ideias e reivindicações.
E merecem, é claro, muitas reflexões.
Comecemos pela vaia no Mané
Garrincha. Penso que muitos equívocos estão sendo cometidos a
propósito da Copa do Mundo no Brasil. Ela poderia , sim, ser uma festa
para o povo brasileiro se, efetivamente, estivesse voltada para o povo,
mas não do jeito que é concebida, segundo o malfadado “padrão FIFA”.
Dilma recebeu a vaia classe “A” das elites embranquecidas presentes à
“festa” na inauguração da Copa das Confederações porque aquela não era
nem jamais poderia ser a sua gente, que, aliás, não foi convidada para a
festa. Simples assim: vaiaram Dilma aqueles que não votaram nela e que
insistem em desconsiderar o resultado das urnas.
Já as manifestações de rua têm uma
complexidade maior. É impossível deixar de reconhecer sua expressividade
como movimento de jovens idealistas da classe média, embora se possa
enxergar que, em meio a um mar de reivindicações díspares, grande
parte deles não saberia explicar em profundidade por que estão nas
ruas...
É claro, porém, que o movimento não
surgiu do nada. Tenho muitos alunos de postura consciente, que dele
participam ou a ele são simpáticos . Por outro lado, há também uma
difusa manifestação tribal em que internet, aliada à natural tendência
contestatória dos jovens, propiciou os encontros e as palavras de ordem
que se espalharam pelo país. Palavras, aliás, que a mídia manipulou,
selecionou, editou e divulgou ao seu bel prazer, ou melhor, segundo suas
conveniências, fazendo um jornalismo traiçoeiro, como sempre,
provavelmente optando por tomadas aéreas para evitar o dissabor de ter
que divulgar o que não interessava....
Não cabe censurar os jovens, mesmo
que, talvez, estejam embarcando em algumas canoas furadas. É bem melhor
essa sua manifestação do que o habitual cultivo dos seus umbigos.
Muitos deles, seguramente, aprenderão nas ruas a verdadeira cidadania.
Cidadania que nada tem a ver com os depredadores – horda que engloba
fascistas , marginais, histéricos e ladrões – cujas ações falam por si ,
mas que também não saíram do nada. No caso, quem pariu Mateus que os
crie..
O pessoal do passe livre, que obteve
sucesso em suas reivindicações, agora denuncia a presença da direita no
movimento e declara sua retirada das ruas. Mas não nos iludamos:
continuarão em ação, agora, os golpistas de sempre que, com o apoio de
mídia conhecida, apostam claramente todas as suas fichas no caos,
indiferente aos males que poderão advir para o país em termos globais.
Alguns jornalistas e “especialistas” de
plantão, não sei se intelectualmente incompetentes ou deliberadamente
mistificadores, agem e falam como se vivêssemos aqui as crises do
Egito, da Turquia, da Espanha e de tantos outros desastres econômicos ou
sociais. Atuam no interesse de seus patrões e no sentido do “quanto
pior melhor”, insinuando, sempre que possível, que o movimento se volta
contra o Governo federal. Alguém, em sã consciência, acredita que o
povo brasileiro, no geral, repudie um Governo que, dois dias antes,
tinha aprovação da maioria?
Tem havido uma tentativa permanente -
crápula, mentirosa - de transformar a realidade brasileira em um caos
fictício, que envolve uma falaciosa luta contra a inflação (no fundo
ardentemente desejada) e uma falsa defesa da economia (que querem ver
arrasada), como forma de recuperar o poder para o pessoal da classe que
vaiou Dilma. Essa turma vê, no aproveitamento das manifestações de rua,
a possibilidade de um golpe branco, partindo, como sempre, de um
combate à corrupção, que historicamente tem servido à direita como
palavra de ordem que sabemos hipócrita, pois só se volta para os
adversários e, convenientemente, esquece as falcatruas dos seus
próprios componentes.
Mas quem não sabe brincar não devia
brincar. Anselmo Gois talvez esteja antevendo isso quando diz, em sua
coluna que “o perigo é transformar uma limonada em um limão”. Resta
saber perigo para quem...
Dilma Roussef fez, a meu ver, um
convincente discurso de estadista sobre o assunto. Ao abrir o diálogo
com os manifestantes, repudiar o vandalismo e convocar toda a classe
política para um pacto que envolva compromissos concretos com a pauta
social, assume as posturas que se esperam de quem detém o apoio popular.
E Dilma – não se enganem - não é Fernando Collor. É óbvio que, a
continuar a coisa como está, estarão nas ruas outros atores importantes.
E eles virão, se houver radicalizações golpistas, para expressar a
manutenção de suas conquistas e contra o golpe. E para fazer outras
reivindicações, que talvez não agradem aos homens da mídia. Dilma– que,
aliás, possui nas ruas o seu DNA - não tem por que fugir das praças,
mas incorporá-las como espaço de grandes manifestações, reivindicações e
mesmo decisões. Isso se chama democracia participativa, em muitos casos
mais efetiva que a representativa, quando esta tem como móvel o
fisiologismo político. É muito melhor estar no meio do povo do que ir
às festas da elite para ouvir vaias ou alimentar os golpistas com
polpudas verbas de publicidade...
artigoRodolpho Motta Lima