Há
dias passados recebemos eu e minha mulher, em nosso apartamento, a
visita de Pablo Tumang, um companheiro de lutas pretéritas levadas a
efeito no Espírito Santo sob o signo do voluntariado: tínhamos de tirar
dinheiro do bolso para cobrir despesas resultantes das causas em que nos
empenhávamos. Fazer hoje esta declaração é importante porque vivemos
num tempo dominado pelo interesse pessoal. Ganhar dinheiro a qualquer
custo é a ordem do dia. Ser pobre é humilhação. Homem feliz é o homem
rico. São Francisco de Assis foi um infeliz, um derrotado.
Pablo
Tumang ostenta 86 anos de idade. Usei de propósito o verbo ostentar
porque é isso mesmo: Pablo exibe um corpo de idoso habitado por uma alma
de menino.
Lembrando
os velhos tempos do voluntariado que praticamos lado a lado,
especialmente em atividades da Arquidiocese de Vitória, Pablo veio com
um novo desafio: a criação em nossa capital de uma obra destinada à
valorização do idoso, nada parecido com asilo de velhos. Muito pelo
contrário. Alguma coisa que facilite a inclusão dos idosos na luta pela
transformação do mundo, um mundo do qual se extirpe o egoísmo e onde se
faça do altruísmo, da abnegação e da crença na dignidade da vida a senha
para entrar.
A
obra projetada será para idosos. Entretanto, sugeri a Pablo que jovens
fossem convidados para a empreitada. Seriam a vanguarda; os idosos, a
retaguarda. Completei. Fale com Homero Junger Mafra, presidente da OAB.
Ele certamente não poderá aceitar o encargo, pois a presidência da Ordem
dos Advogados já o absorve de todo. Entretanto indicará jovens
idealistas e de coração aberto que se proponham a enfrentar o desafio,
pois ele conhece meio mundo e é muito estimado.
Hoje
se diz que a partir dos 60 anos mulheres e homens entram na Terceira
Idade. Alceu de Amoroso Lima discordava dessa visão. No livro “As Idades
do Homem”, esse pensador dividia em cinco fases a caminhada dos seres
humanos: infância, adolescência, mocidade, maturidade e velhice. Para
Alceu a velhice começava aos 65 anos e não era uma idade de descida,
decrepitude. Muito pelo contrário. Era uma idade de ascensão. Colheita
de frutos. Aperfeiçoamento da vida. Sublimação. Vôo. E Alceu, na sua
existência, experimentou a velhice que desenhou em “As Idades do Homem”.
Coerente até o fim. Lúcido. Corajoso, intrépido mesmo, censurou a
ditadura instaurada em 1964, num momento em que essa atitude, assumida
por um intelectual de grande prestígio, poderia ocasionar a prisão.
A
viuvez, que poderia ter sido dolorosa e triste, ele soube
sublimar. Lia toda manhã uma das cartas de sua mulher. Somente
uma. Nunca mais de uma. Era a fruta saborosa daquele dia.
Por: João Baptista Herkenhoff
é magistrado aposentado (ES), palestrante e escritor.